quarta-feira, 3 de junho de 2009

A velha profecia

Há algum tempo atrás, um amigo, ao analisar o que ele considerava como as fraquezas e “incorreções” do sistema capitalista, me disse a seguinte frase: “O Estados Unidos e o capitalismo são como gigantes obesos. Um dia a barriga vai pesar tanto que eles vão cair para frente”. Até hoje eu não sei se essa formulação foi mesmo criada por ele, ou foi uma reconstrução ou apropriação de outro autor. No entanto, vejo que ali, naquela explicação meio simplista, estavam presentes alguns daqueles profetismos radicais que, volta e meia, proferimos e que, muitas vezes, dizem mais do que parece.

A concordata da General Motors (GM), anunciada no inicio desta semana, me fez lembrar muito dessa frase que me foi dita. Há uma década atrás, se falar em falência da GM era quase que um pecado para os então ascendentes neoliberais e suas “novas” teorias de Estado mínimo. Fundada em 1908, a GM em mais de cem anos de existência, registrou 8,35 milhões de veículos automotivos vendidos em 140 países. Tinha 252 mil empregados espalhados pelo mundo e mercados consolidados nos Estados Unidos, China, Brasil, Reino Unido, Canadá, Rússia e Alemanha. Ora, dizer então que uma empresa desse porte um dia iria cair, era como se disséssemos hoje que, daqui há alguns anos, a Microsoft ou a Apple irão à bancarrota. Se pensássemos bem, há 10 anos atrás, realmente, a GM pareceria intransponível. Com seus inúmeros modelos de automóveis, a indústria era uma das grandes forças do capitalismo estadunidense. A GM, com seus Cadilacs e Chevrolets esteve presente nos desejos de consumo de diversas gerações espalhadas pelo planeta. Por quase 80 anos ela dominou a cena econômica mundial como uma das mais bem sucedidas empresas da história: “no mundo todo a GM simbolizava os Estados Unidos e seu poderio econômico. As aletas tipo "rabo de peixe" que adornavam os Cadillacs eram conhecidas e desejadas em todos os cantos do mundo Por algum tempo a GM dominou uma parte tão grande do mercado americano que o governo começou a pensar em usar as leis antitruste para desmembrá-la - a mesma ameaça já sentida pela Microsoft... (Netmarinha)”

Porém, apesar de toda a força econômica, o fato é que, a derrocada aconteceu. Atolada em dívidas que se acumulavam ao longo dos últimos anos, a “grandiosa” General Motors sucumbiu frente a Lei de falências americana. No último domingo (31), a o governo dos EUA anunciou que a montadora pediu abertura do processo de concordata. Todo o procedimento deverá durar cerca de 90 dias e resultará no fechamento de 11 fábricas da empresa em todo o mundo. O governo federal dos EUA irá aplicar US$ 50 bilhões (US$ 20 bilhões já foram liberados), e passará a controlar 60% do capital da empresa. Outros 12% do controle acionário ficará com o governo do Canadá que liberou uma verba de US$ 9,5 bilhões.

Concretizava-se, pois, a velha “profecia inconsciente” que ouvi no passado: um gigante caiu em cima de seu próprio peso. O pesadelo de neoliberais, por incrível que pareça está vivo e muito forte: o ESTADO. Sem a mão reguladora do governo Bush e agora da gestão Obama, a GM já teria sucumbido há muito tempo. Pelo que estamos podendo ver, a força governamental e estatal não foi tão minimizada quanto se supunha. No mundo inteiro vemos empresas recorrendo aos governos de seus países para não levarem consigo parte da estrutura capitalista que criaram. O que se pode dizer é que, com a queda da GM, o sistema estadunidense de vida capitalista está com uma profunda ferida. Talvez esse seja o anuncio de que uma nova formulação econômica e social precisa ser pensada e levada mais a sério.

Como disse o jornalista e amigo Ricardo Santos, “a concordata da general motors é uma ironia da história[...]. A GM não é apenas uma empresa, é um ícone cultural. Acho que o povo de lá nunca teve seu american way of life tão ameaçado. Em pearl harbor eles tiveram sua revanche, e no 11 de setembro também. Agora, a coisa é diferente: os inimigos são os próprios americanos e seu nível de consumo inconseqüente”.

De todas essas "reviravoltas", o que sabemos é que a nossa história está mudando. E precisamos ser atores disso tudo. O capitalismo como um todo não irá cair, mas, com certeza, já está se metamorfoseando mais uma vez. Cuidados, então, são precisos para que não percamos mais esse "bonde"...

Foto: Ahren D
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6 Comentários:

aprendiz de mentiroso disse...

parabéns pelo texto, black. nem 8 nem 80, o tamanho certo para blog. quero ver mais desses por aqui. a verve está a afiada, como sempre.

3 de junho de 2009 às 21:34
Anônimo disse...

Muito bom seu texto. O que eu acho cômico, apesar da situação, é que os americanos agora estão estatizando.

Abraços

9 de junho de 2009 às 21:49
Francisco Castro disse...

Olá, Henrique!

A força dos Estados Unidos e suas gigantescas empresas tiveram um abalo muito fortes nos últimos tempos. Por sorte os governos agiram a tempo de não haver uma desgraça muito maior do que ocorreu. Se não fosse a ação do governo teríamos uma crise extremamente forte.

Abraços

Francisco Castro

9 de junho de 2009 às 22:00
Henrique Oliveira disse...

Ricadão, seuluiz,

Obrigado pelos elogios e pela visita...

Seu luiz,dei uma passada no seu blog. Gostei... Voltarei mais vezes...

Um abraço!

10 de junho de 2009 às 12:35
Henrique Oliveira disse...

Em relação a essa "onda estatizadora" que está salvando empresas amaericanas, vejo como sendo a grande "reviravolta" histórica nessa coisa toda.
Ou seja, a coisa não era tão liberal quanto se pensava e se queria (FHC que o diga) há alguns anos atrás.
O Estado mostra com essa crise que a economia global ainda precisa de regulação do governo. Aquela história de Estado mínimo foi meio que por água à baixo... Afinal, a história não é fixa, ela muda, e muito...

Abraço.

10 de junho de 2009 às 12:41
Guilherme Freitas disse...

A má-administração dos últimos governos americanos levou os EUA a essa situção. As guerras e a filosofia Bush foram o empurrão para o abismo. Os EUA vão demorar para sair dessa crise. Abraços.

18 de junho de 2009 às 13:07

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